Destruição de uma equipa 

 

Amigo de Toni, mas adepto da contratação de Artur Jorge  
 

«Quando o presidente decidiu apostar em Artur Jorge considerei que era um acto de gestão e, como sou
muito disciplinado, limitei-me a apoiá-lo. Sou muito amigo do Toni e custou-me muito a forma como o processo se desenvolveu, mas também entendia que era preciso mudar. Estive e estou solidário com Manuel Damásio nesse capítulo. Amigos, amigos, negócios à frente. Antes de o (Artur Jorge) conhecer não pensava nada, pois não o conhecia. Este ano fez um bom trabalho. Limpou muito bem o que havia para limpar. Viu-se livre dos jogadores chatos, construiu um plantel à partida mais disciplinado. Quanto à direcção, parece-me que esteve bem ao prescindir de jogadores com ordenados caros.»  (Entrevista de Luís Sobral a Vilarinho em 1995)

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Vilarinho: as coisas que ele dizia do Benfica em 1995
28/10/2000 | 07:30

Luís Sobral

Em Julho de 1995 tive oportunidade de entrevistar Manuel Vilarinho. Saíra há sete meses da Luz, como primeiro demissionário da direcção de Manuel Damásio, eleita em Janeiro de 1994.  
 
Durante meses, Manuel Vilarinho manteve-se em silêncio e deixou que a explicação oficial para a sua saída («motivos profissionais») prevalecesse. Até ao dia em que resolveu contar o que o distanciava de Manuel Damásio. A entrevista foi publicada nas páginas de «A Bola» a 27 de Julho.   
 
Mais de cinco anos depois, é um ponto de partida para compreender a forma de pensar do novo presidente do Benfica. Claro que muita coisa mudou entretanto, mas algumas das ideias expressas na altura permanecem actuais e outras, quando confrontadas com a realidade actual, não podem deixar de fazer sorrir. Uma delas é especialmente significativa: há cinco anos, Manuel Vilarinho assumiu a vontade de um dia ser presidente do Benfica. «Era a coisa que mais gostava na vida», sintetizou na altura. Está conseguido.   
 
Com a devida vénia ao jornal «A Bola», recordo algumas das passagens mais curiosas dessa conversa. É uma forma de ajudar a explicar quem é o novo presidente do Benfica e como evoluiu o seu pensamento em cinco anos.  
 
Benfica: um monstro  
 
«Mal tomámos posse manifestei publicamente a minha opinião sobre o Benfica: é um monstro que tem de ser desmembrado! Como estava (e está), o clube não tem viabilidade.»  
 
Só quatro modalidades  
 
«Há anos, era possível ser eclético, ter um determinado nível de vida. Hoje é impossível. Temos de olhar para o Benfica e perguntar: quais são os produtos vendáveis? Respondo: são quatro. Futebol, natação, ténis e ginástica. Continuar a manter o ecletismo sem razão de ser é cavar o fosso de onde talvez nem o futebol consiga sair. Mais: talvez nem o futebol possa, no futuro, garantir a solvabilidade do Benfica!»  
 
Sociedades desportivas: única hipótese   
 
«A única hipótese é constituir sociedades desportivas e investir 50 mil contos e deixar a quem quiser que invista o resto. Difícil vai ser arranjar sócios, pois os lucros não são distribuídos e os custos são enormes.»  
 
Manuel Damásio geria a crise, como os outros  
 
«A direcção de Manuel Damásio tornou-se igual às anteriores, limita-se a gerir a crise, não é inovadora, anda à espera que o tempo resolva o que não pode ser resolvido pelo tempo. O Benfica arrisca-se a perder a grandeza desportiva que tem. Eu próprio é que fiquei decepcionado, pois sempre pensei que ia poder dizer mais tarde que tinha ajudado o Benfica a mudar e a verdade é que pouco ajudei ou nada.»  
 
Amigo de Toni, mas adepto da contratação de Artur Jorge  
 
«Quando o presidente decidiu apostar em Artur Jorge considerei que era um acto de gestão e, como sou muito disciplinado, limitei-me a apoiá-lo. Sou muito amigo do Toni e custou-me muito a forma como o processo se desenvolveu, mas também entendia que era preciso mudar. Estive e estou solidário com Manuel Damásio nesse capítulo. Amigos, amigos, negócios à frente. Antes de o (Artur Jorge) conhecer não pensava nada, pois não o conhecia. Este ano fez um bom trabalho. Limpou muito bem o que havia para limpar. Viu-se livre dos jogadores chatos, construiu um plantel à partida mais disciplinado. Quanto à direcção, parece-me que esteve bem ao prescindir de jogadores com ordenados caros.»  
 
A história dirá quem tinha razão  
 
«Falo agora porque me parece importante forçar a actual direcção a fazer o que deve fazer. Se não fizer, ficará na história do Benfica como incompetente e incapaz. Tem ano e meio para realizar o que eu acredito que deve ser feito. A história dirá depois quem tinha razão: eu e todos os que pensam como eu, ou a actual direcção.»  
 
Oposição nunca  
 
«Nunca hei-de ser oposição no Benfica. O clube está primeiro e eu estou com quem o tratar bem e contra quem o tratar mal.»  
 
Gostava de ser presidente  
 
«Gostava muito. Era a coisa que mais gostava na vida. Só que não quero, não posso perder o bom senso».  
 
Se a vida mudar
 
 
«Ser presidente é uma tarefa que exige disponibilidade absoluta. Em part-time resulta um mau trabalho e eu não gosto de fazer maus trabalhos. Nos tempos mais próximos é uma ideia que está afastada. Se a minha vida mudar
... De qualquer forma, sempre digo que nunca seria presidente com mais de três a cinco dirigentes, que pensassem todos da mesma forma. É que há pessoas que mudam quando dão os primeiros passos entre a estátua do Eusébio e a águia.»  
 
Medo de ser preso?  
 
«Tenho formação jurídica e a escola de Direito ensinou-me a ter respeito pelas leis que estão publicadas. Como conheço as leis, tive justo receio de que nem sequer me pudesse defender se por acaso fosse indiciado por qualquer conduta considerada penalmente ilícita relativamente a casos de não entrega de dinheiros para a Segurança Social e o IRS. Como achava que havia forma para obviar essa situação e não o conseguia fazer, aí está uma razão para deixar o clube.»  
 
Três ou quatro coisas por fazer  
 
«Primeiro, desmoronar o edifício, manter apenas os produtos que vendem bem: futebol, ténis, ginástica e natação. Dispensa de funcionários. Tratamento eficiente dos sócios, que são os nossos clientes. Um bom espectáculo desportivo.»  
 
O Benfica e o povo  
 
«O Benfica pode continuar a ser um clube do povo, mesmo que faça algumas sociedades desportivas. Tem é de se preocupar em ter dirigentes capazes e não pessoas incompetentes, que se aproveitam, que pretendem apenas dar nas vistas».

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